quinta-feira, 23 de julho de 2009

Prelúdio do em vão

O céu cinza era apenas o prelúdio do meu dia estendendo-se acima de mim. Eu caminho todos os dias sob o céu, em passos orientados já não sei mais por quem. Pensamentos perdidos esvoaçando enquanto meu corpo já não fornece mais resistência às pancadas das ondas que marejam em meus olhos.
Indecifrável entre milhares de sombras que trombam diariamente comigo. Às vezes eu ainda me impressiono ao notar que nem mesmo as dezena de pessoas que se considerariam 'mais próximas' percebem meu estado de espírito. Eu disse perceber? Perdão, eu quis dizer aceitar. Vasculham minhas expressões, reprimindo aquelas não desejáveis. "Seja mais simpática", "sorria", " por que está olhando deste jeito?!", "Eu reconheço que esta mais quieta hoje", "não desconte nos outros, você tem que continuar falante".
E eu visto novamente o personagem que todos querem ver. Ah, doce palhaço de circo. Eterno bobo da corte fadado a divertir os outros com sua sagacidade não compreendida. Só em sua inteligência.
No fundo todos me lançam olhares;

"Lá está a estranha sem coração.
Quem se importa? É só uma estranha sem coração.
Seus sentimentos existem em vão."

E eu retruco aos berros aguniados com a angústia que ainda há em mim;

"Se esta aqui é uma estranha sem coração.
É porque todos os seus sentimentos foram sofridos em vão.
Meu coração foi arrancado à mão."

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Partituras

Foi num rompante que percebi ao que estava fadada. E talvez somente eu estivesse. Olhei ao meu redor, escutei batidas como nunca! Mergulhei em mim. Descompasso. Sim, eu sou descompasso. Em um mundo em que corações desajustados buscam outros igualmente desajustados para dividir o mesmo compasso, eu sou descompassada.Meus batimentos cardíacos compuseram uma partitura única e desacredito que haja outro capaz de bater no mesmo ritmo, ao mesmo som.
Me disseram que dois corações tem que palpitar juntos para ser amor. Recuso! Recuso e recuso a ajustar-me a outro coração.Não me peça para palpitar seu ritmo. Eu não quero ser ritmo. Formei-me em descompasso, tornei-me descompasso. Se compassar-me a outrém, o que será de mim? Se de repente ouvisse a mesma melodia tão conhecida, encantaria-me por ela? Creio que por instantes eu estaria fascinada ao escutar meu som emanando de outro alguém. E nos instantes seguintes, escutaria. De tanto ouvir, conheceria. De tanto conhecer, entediaria. Decorar aquela musica traria a mim a morte do interesse.Eis que afundaria novamente em mim, a procura desesperada de algo inovador e, surpreendentemente, descobriria outro som. A partitura mudara. Aquele já não era mais quem batia junto a mim. Restaria apenas então aventurar-me outra vez no mar de sons. Seria eterna busca, eterna frustração. Barco predestinado a navegar as profundezas do oceano sem jamais encontrar seu porto.
Entretanto, se prosseguisse eu no meu descompasso e a sorte do acaso trouxesse a mim outra vibração harmônica, eis que encheria-me de felicidade! Não, não aquela que fosse idêntica a mim, mas sim a que me completasse! Seriamos eterna música, eterna sinfonia em sons que nunca saberiamos de cor, muito menos salteado. E cada dia que dormisse às margens de seu peito, ouviria novo concerto, fascinaria-me com novas notas. Graves e agudos de todos os jeitos que pudéssemos compor. Afinariamos, sim, nossos corações um ao outro. Mas sem que perdessemos aquilo que há de mais importante em nossa relação; a originalidade de sermos nós mesmos!

domingo, 5 de julho de 2009

Pássaro e àrvore.

Gente, hoje achei esse texto que escrevi ano passado, espero que vcs gostem =D




Pássaro e àrvore


O amor pode pousar em nós, como uma ave em uma àrvore, só por um breve instante, e depois voar para longe.

Ele pode aproximar-se apenas para colher o fruto que deseja, saciar-se e ir embora.

Assim como pode também construir um ninho, uma vida, e não nos deixar mais.

Certas vezes, ele se vai mesmo que queira ficar.

Outras vezes, a ave voa e seu ninho permanece, com vestígios da vida que ali um dia habitou.

O que esquecemos é que cada vez que uma ave leva consigo o fruto , leva junto a semente que vai germinar outra àrvore, em outro lugar.

O que seria da ave sem a àrvore para abrigar-se, alimentar-se e descansar?

E o que seria da árvore sem a ave para levar suas sementes além do horizonte?

A ave morreria de fome, sem abrigo, ou acabaria cansada demais para continuar seu trajeto e seria facilmente predada.

A àrvore não teria quem levasse suas sementes para longe, logo nunca teria parte de sí em outro lugar, ficando limitada.

Em uma relação, somos pássaro e somos árvore.

Colhemos e cedemos frutos, nos abrigamos e somos abrigados. E mesmo quando voamos para longe, levamos conosco parte do que deixamos para trás. Ainda quando somos deixados, continuamos a viver sabendo que outros pássaros virão.

Assim, não devemos criar gaiolas nem cortar nossas asas, pois sempre haverá uma àrvore para pousarmos, ou um pássaro para nos encontrar.