De repente, após todo este ano compenetrada em reservar meus pensamentos apenas a mim e a
pouquíssimas pessoas ao redor, após ter aceito o conselho de calar minha boca e após ter contrariado um dos traços mais marcantes em mim mesma, o de não ficar quieta, o de questionar em voz alta, que pode ou não ser uma qualidade, mas que ainda assim carrego; Eu cansei.
Eis o motivo de estar aqui, criando este blog com a finalidade de expressar algumas opiniões e compartilhá-las,
discuti-las, aperfeiçoá-las.
Sim, eu já tenho um
flog, mas ali eu prefiro postar qualquer coisa que acontecer. O que quero aqui é montar um
blablablá de coisas que noto e não consigo deixar passar.
De início, gostaria relatar uma experiência que tive meses atrás, causando uma que sensação não me abandonou. Estava andando pelo bairro da Liberdade, em uma noite fria, congelante. Rumo ao
metrô. Nas escadarias,
vi um menino tão negro, tão negro, que se não fosse o branco de seus olhos talvez não o enxergasse. Ele estava sentado em um degrau, com o corpo inteiro enfiado numa camisa suja bege o
bviamente muitos números acima do que deveria usar. Seus olhos, assim como os gestos, eram desesperados por qualquer tipo de caridade, mais do que isso, por um pouco de atenção.
Ansiavam que alguém não só o notasse, como o visse. Apesar de não concordar com a conduta das esmolas, acabei despejando algumas moedas em suas mãos.
Até então, apesar de comovida, não era algo que saísse da rotina de uma cidade grande e monstruosa como São Paulo.
O que me chocou foi que, lá de baixo, quando olhei para cima, vi, alguns degraus mais alto que eu, o menino ainda parado tentando vencer o frio e, alguns poucos degraus acima dele, uma dezena de jovens entre 13 e 20 e poucos anos se divertindo, rindo alto, estridente. Alheios àquela criança, alheios ao frio, alheios à tudo que não girasse em torno da atmosfera que criaram para
si naquele momento.
Eis a sensação que não me abandona mais. Não me sinto capaz de descrevê-la, mas se aproxima de uma espécie de indignação, com frustração, com desprezo, com desespero, com um nada enorme.
Nenhuma daquelas pessoas via, ou se via, sensibilizava-se com a situação de uma criança que não tinha mais de 10 anos passando frio e fome poucos degraus abaixo de seus olhos. Ninguém se importava. Já estamos tão acostumados com a impunidade que nos tornamos hipócritas. Eu diria ''
coisificados'', desumanos.
O que afinal somos? Que sociedade construimos, ou no caso da minha geração, que sociedade sustentamos?
Não acho que
devêssemos parar de rir, de nos divertir. Mas não acho que devemos ignorar situações como essa, que cruzam nosso caminho diariamente.
Quando iremos reagir?